domingo, 27 de abril de 2008

Materia Fumo-Reformulada

Fumo

Convenção Quadro abala fumicultura no Recôncavo
Tratado internacional de saúde pública prevê a erradicação gradativa das lavouras de fumo

Por Gustavo Medeiros, Kelma Costa e Orlando Silva

A Convenção Quadro, estabelecida pela OMS (Organização Mundial de Saúde) tem por objetivo controlar o plantio e cultivo do fumo no mundo. A partir da adesão do Brasil à essa Convenção em 2003, os setores ligados à cadeia produtiva sofrem um impacto substancial, pois a pretensão é que até 2023 as áreas onde o fumo é plantado sejam reduzidas. No Recôncavo da Bahia, região que responde por grande parte de produção e comercialização, a fumicultura enfrentará os danos econômicos causados pela diminuição da área cultivada, como a repercussão negativa no cenário socioregional, alem do desemprego, atingindo principalmente da mão de obra feminina que é maioria. Atualmente, o debate na Câmara Setorial do Fumo, que congrega os setores da cadeia produtiva do fumo, representantes do Executivo e Legislativo e o ministério da saúde, se estende à estrutura da indústria fumageira e os males causados pelo tabagismo, bem como a provável substituição da cultura do fumo por outras lavouras.

INTENÇÕES - Para Osvaldo da Paz, secretário da agricultura de Cruz das Almas, a Convenção Quadro não tem a intenção de acabar com a fumicultura no Recôncavo, mas sim promover uma diversificação na atividade, uma vez que a pretensão do ministério da fazenda é fixar taxas sobre os charutos e cigarrilhas produzidos. Segundo ele, para lidar com a redução de postos de trabalho, decorrente da queda na produção, um projeto foi elaborado e discutido com diversos órgãos, que consiste em incentivar a produção de oleaginosas nas áreas de fumo, ressaltando que é impossível substituir a atividade fumageira, devido a garantia da assistência técnica oferecida pelas empresas, desde a formação das mudas até a sua comercialização.

O secretário também enfatiza que, devido às condições climáticas, além das restrições em algumas regiões do mundo, muitas empresas irão migrar para o Recôncavo, onde se produz o melhor fumo capeiro.

Quanto às mulheres, que são maioria na produção de charutos, da Paz afirmou que existe outro projeto que consiste na confecção de doces caseiros em parceria com a EBDA (Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrário) e a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), além de outros cursos que capacitam as operárias do fumo. “Enquanto houver consumidores, haverá plantadores e só vai parar de plantar fumo quando não tiver mais produtor de charutos”, afirma.


IMPACTOS ECONÔMICOS - Josenita Salomão, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Fumo e Alimentícia, afirma que haverá uma diminuição no número de empregos, aumento dos impostos nas exportações e um acúmulo de importações a custos baixos de charutos.

Em toda a região, a atividade fumageira gera em torno de 18.470 empregos diretos e indiretos. No município de Cruz das Almas, este número não aparece definido, contudo, Josenita salienta que a tendência é haver uma diminuição na quantidade de postos de trabalho. Ela se diz mais preocupada com os trabalhadores que possuem contrato de três meses. Os empregadores fazem isso para não pagar encargos sociais, o que precariza as relações de trabalho. “Isso é legal, mas é imoral”, alega.

Para ela, a Convenção Quadro vai acabar com áreas de plantio, ocasionando um aumento no índice de marginalidade, além da fome e do desemprego. A sindicalista vislumbra um futuro triste para a fumicultura na região com a ratificação feita pelo Brasil e cita o exemplo da cidade de Maragojipe, onde a Suerdieck fechou as portas, restando apenas a atividade pesqueira como opção para os antigos trabalhadores. “O fumo está na UTI”, diz Josenita.

Daniel Schimidt, gerente de pessoal da DANCO, afirma que, com a diminuição no cultivo de fumo, haverá uma decorrente redução na necessidade de produção, logo isto vai acarretar em uma ligeira queda na circulação de dinheiro, alem da diminuição da cadeia produtiva. Segundo ele, houve uma redução de 85% na produção nos últimos 10 anos.

Quanto a redução do plantio, os empresários alegam que a questão do Custo Brasil para exportação inviabiliza a produção, devido ao valor do Dólar em relação ao Real, alem do aumento dos impostos.

RELAÇÃO - Carlindo Pinto, agricultor em Cabaceiras do Paraguassu, afirma que a relação entre o agricultor e as companhias fumageiras consiste na integração, onde as empresas fornecem todos os insumos para o plantio do fumo, financiam o custeio e proporcionam a estrutura para a produção. Em contrapartida, o lavrador tem que entregar a produção total ou parcial. Na época de grande demanda, o armazém compra a safra, mas quando há excendente de fumo os compradores rejeitam. Tambem existe a figura do atravessador, que é um aliado dos fumicultores.

Há 2 anos sem produzir fumo,Carlindo contou que já vendeu 247 arrobas para a Fumex Tabacaleira no ultimo ano de produção,conseguindo um preço médio de R$ 50,00 por arroba e alega que desistiu de plantar fumo devido a falta de compromisso das empresas fumageiras,uma vez que a margem de lucro do agricultor é pequena,por conta do baixo retorno financeiro.Ele declara que está plantando limão,pois dá menos trabalho do que a fumicultura,que leva em torno de 8 meses de trabalho intensivo,alem de maior quantidade de pessoas na mão de obra.

Outras causas estão na baixa produtividade da planta e nos prejuízos à saúde devido as condições de trabalho. Atualmente, com o plantio do limão, sobra o tempo necessário para as atividades escolares, a exemplo da sua graduação no curso de jornalismo da UFRB.

DANOS - No que diz respeito aos problemas contraídos pelo trabalho com o fumo, Josenita Salomão alega que nenhum aposentado sentiu nada e ela nunca ouviu dizer que alguém teve problemas no contato com o fumo. Segundo ela, atualmente, antes de entrar na firma, os trabalhadores fazem exames médicos.

Já Dona Maria Francisca, operária fumageira aposentada, diz que trabalhou dos 11 aos 39 anos em condições insalubres e contraiu um nódulo no pulmão. Segundo ela, muitas pessoas que trabalharam com o fumo têm o mesmo problema. Dona Maria afirma que, quando era criança e trabalhava na indústria de fumo, ela ficava escondida nos banheiros para não ser descoberta pela fiscalização.

A Convenção Quadro introduziu uma série de regras no intuito de reduzir e prevenir o consumo de cigarros, tentando coibir os males causados pelo consumo do tabaco nos países em desenvolvimento.

Daniel Schimidt relata que o Brasil tem enrijecido bastante a legislação antitabagista, promovendo um aumento mínimo de R$ 4,00 no maço de cigarros para inviabilizar o consumo. Esse reajuste ainda não foi aprovado pela Receita Federal, devido ao grande numero de produtos clandestinos oriundos do Paraguai, que pode ser agravado com o aumento dos preços no Brasil.

HISTÓRICO - O fumo já era cultivado na América bem antes do contato do povo europeu. Produzido em larga escala no período colonial, estava voltado para o mercado externo e, no Recôncavo, ficou paralelo à economia açucareira, sendo utilizado como troca na aquisição de escravos africanos. No final do século XIX, com a chegada do processo de industrialização no Brasil, várias indústrias estrangeiras se instalaram na região. É o período áureo da produção fumageira.

Nas primeiras décadas do século XX, a região chegou a ter 50 unidades fabris, dentre elas a Suerdieck e a Danemann. Essa última continua a funcionar nas cidades de São Felix e Cruz das Almas, possuindo na força de trabalho feminino o seu maior efetivo. Antes do processo de industrialização, era muito comum vê-las enrolarem o fumo “nas cochas”. Elas continuam sendo maioria na produção de charutos e das cigarrilhas. No inicio da década de 80, uma crise, decorrente da superprodução, assolou o fumo baiano.

Hoje, a atividade se estende por quase toda a região, tornando assim uma prática econômica forte e acima de outras culturas. Segundo dados da SEAGRI (Secretaria Estadual de Agricultura), os principais clientes são alguns países europeus, além da Indonésia, Tunísia, Estados Unidos e Honduras. Quanto às áreas plantadas, são, aproximadamente, 13 mil hectares, o que faz gerar uma media de R$ 5,00 por quilo da folha, chegando, no primeiro semestre de 2007, aos R$ 55,6 milhões o valor da produção. O Recôncavo responde por 42% da produção fumageira no Nordeste, proporcionando um faturamento bruto de R$ 16 milhões. A Bahia participa com 66% da produção nordestina, seguido de Alagoas, onde a produção cresceu 30% no ano de 2006, segundo dados do historiador Jean Baptiste Nardi,especialista em fumo.

ALTERNATIVAS – No Recôncavo instala-se a UFRB (Universidade Federal do Recôncavo), EBDA (Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrário) e a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), instituições que podem, a partir dos seus potenciais de pesquisa e transferência de tecnologia, viabilizar alternativas capazes de substituir a cultura do fumo por outras culturas destinadas a alimentação e ao agrocombustivel. Pelo menos foi o que definido na reunião realizada em 2007 para discutir as alternativas paralelas à fumicultura diante da perspectiva de um quadro caótico para o Recôncavo Baiano. Segundo a secretaria de agricultura de Cruz das Almas, o ministério do desenvolvimento agrário lançou um programa que visa diversificar a fumicultura, preparando o agricultor e capacitando os jovens no PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar).

OS CLIENTES

Principais destinos do tabaco da Bahia

Destino

Percentual

Paises Baixos

23%

Alemanha

16%

Indonésia

16%

Bélgica

10%

Portugal

6%

Honduras

5%

Estados Unidos

4%

Tunísia

3%

Espanha

3%

Outros

14%

Fonte: Seagri-BA/Secex

PELO MUNDO

Exportações baianas de tabaco

Ano

US$ FOB

Volume (Kg)

2000

15.353.229


2001

14.553.463


2002

14.664.194


2003

17.320.357


2004

16.748.424


2005

15.653.452


2006

24.641.077


2007*

11.530.645


*Dados de janeiro a agosto de 2007

Fonte: Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC),

Aliceweb – Elaboração: Seagri-BA/SPA

PRODUÇÃO BAIANA

Perfil da fumicultura – Safra 2007

Produção (t)

11.122

Área (há)

12.485

Rendimento (kg/há)

891

Valor da produção (folha)

R$ 55.610.000,00

Preço médio (Kg/folha)

R$ 5,00

Fonte: Seagri-BA, outubro de 2007

EMPREGOS

Pessoas envolvidas na atividade na Bahia – Safra 2007

Categoria

Pessoas

Integrados

4.739

Proprietários

5.630

Parceiros (integrados + independentes)

2.970

Armazém (beneficiamento do fumo)

4.138

Produção de charutos/cigarrilhas

1.000

Total

18.477

Fonte: Seagri-BA

Nenhum comentário: