domingo, 24 de agosto de 2008

A Boa Morte não é da Igreja, diz historiador

Autor de livro sobre a Irmandade critica transformação da festa em mercadoria turística

Graduado em história pela Universidade Estadual de Feira de Santana, o professor Luiz Cláudio Dias Nascimento é autor do livro Candomblé e Irmandade da Boa Morte (Editora: Fundação Maria América Cruz, 2000). Nascido em 14 de abril de 1954, Cacau Nascimento, como é conhecido, é também mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia, onde defendeu, em 2007, a dissertação “Terra de Macumbeiros”: Redes de sociabilidades africanas na Formação do Candomblé Jeje-Nagô em Cachoeira e São Félix. Cacau concedeu uma entrevista coletiva aos estudantes de jornalismo do terceiro semestre da UFRB. Nela, ele fala sobre o seu grande objeto de estudo e revela detalhes pouco conhecidos da Irmandade da Boa Morte. Aqui o leitor encontra a versão completa da entrevista. Uma versão reduzida foi publicada no jornal Reverso. A edição da entrevista é de Anderson Silva.

Reverso: Como surgiu o interesse pelos estudos da Irmandade da Boa Morte?
Cacau Nascimento: Eu comecei a me interessar pela comunidade da Boa Morte por vários motivos. Eu sempre me interessei pela questão da afro-religiosidade. Depois, eu sou uma pessoa de dentro do Candomblé. Eu passei por todo o processo iniciático de um terreiro de Candomblé, e as irmãs da Boa Morte são todas pessoas ligadas a alguns terreiros daqui do Recôncavo. Então, eu comecei a perceber que o segredo, o silêncio, esta metáfora da Irmandade, era o silêncio do Candomblé. Aquilo que não é permitido dizer dentro do Candomblé, a Irmandade da Boa Morte também faz. E fui percebendo que aquilo era um terreiro de Candomblé dentro da Irmandade Católica. É uma Irmandade Católica Apostólica Romana de cunho africano, quer dizer, elas cultuam a morte e assunção de Maria, que faz parte de uma parte da Bíblia que não se usa mais, os apócrifos bíblicos. E, ao mesmo tempo, elas cultuam os Eguns. Isso facilitou eu aprender as coisas. Hoje tem irmãs novas que não sabem porque não houve a transmissão do conhecimento e muitas coisas da ritualidade da Irmandade da Boa Morte se perderam.

R.: Você acha que a Irmandade está perdendo alguns aspectos da ritualidade?
C.N.: A Irmandade da Boa Morte tem uma história muito interessante. A memória oral diz que ela foi fundada em 1820, na verdade não são informações confiáveis. O pessoal da Irmandade fala que ela foi fundada nesse mesmo período, mas não é verdade. A Irmandade da Boa morte vai surgir a partir da segunda metade do século XIX e ela consolida-se como um “corpus religioso” depois da abolição. Então, ela é uma Irmandade muito recente, não é tão velha assim. Ela se estrutura dentro de um movimento abolicionista, dentro de um movimento de lutas, que eu chamo de “resistência surda”, aquela que você não precisa se armar de armas de fogo nem armas brancas para poder enfrentar o seu opositor, mas você usa meios como a Irmandade, como o Candomblé, o Quilombo e a formação de núcleos residenciais.

R.: E o principal objetivo era o de conseguir a alforria dos escravos?
C.N.: O objetivo dela era esse. E elas já eram economicamente importantes, geravam filhos intelectuais. Em 1852, eles construíam a Igreja de Nossa Senhora do Rosário do Sagrado Coração de Maria do Monte da Rua Formosa. Eles davam dez mil reis por semana para fazer o templo e aqueles que não tinham condições econômicas de fornecer, de dar dinheiro semanalmente, davam em mão de obra, trabalhavam como pedreiros, carpinteiros, carregando pedra, fazendo alguma coisa. E, dez anos depois, eles fundam um cemitério pra sepultamento exclusivo de africanos, chamado cemitério dos “achatólicos”, onde eram sepultados ou os ateus ou as pessoas do Candomblé.

R.: Como essas mulheres negras tinham dinheiro?
C.N.: A minha hipótese é o seguinte: a partir de 1827 começaram a acontecer acordos diplomáticos entre a Inglaterra, que estava lá no auge da sua revolução industrial, com os países ainda escravistas. O Brasil era o maior exportador. Para se ter uma idéia, só no século XIX foram 4 milhões de africanos transportados para a Bahia, eles povoaram o Recôncavo Baiano. Só que estes africanos que estavam chegando, a partir destes acordos diplomáticos, por exemplo, de 1800 até 1850, são caracterizados como tráfico ilegal. Os brasileiros faziam tráfico ilegal.

R.: Qual a origem do sincretismo e por que os negros, mesmo após a abolição, continuaram a professar sua fé com rituais católicos?
C.N.: Muitos africanos, principalmente aqueles ao sul do Equador (Moçambique, Angola, Congo), já vieram “catolicizados”. A Igreja Católica, através de Portugal, já conhecia a África muito antes dos primeiros exploradores, muito antes do tráfico escravo. Quando eles chegam aqui no Brasil, eles passam por um processo de imposição da Igreja. Primeiro porque não era permitida nenhuma prática religiosa que não fosse a Católica no Brasil, isso até 1890. Até então, o Estado estava atrelado à Igreja. E o africano, quando passava por aqui, perdia seu nome e ganhava um nome cristão. Observe vocês que os nomes até hoje das mulheres brasileiras são nomes de santas: Bárbara, Amélia, Maria. E os homens, os pais até hoje colocam nomes de santos guerreiros, como Jorge, Antonio. Isso é o grande sintoma de como a Igreja impunha seus dogmas, suas leis, dentro da sociedade brasileira. Então, a estes africanos, que viviam como seres inferiorizados, mas não inferiores, sujeitos sem uma cidadania, a Igreja Católica impunha os seus desejos. A Igreja Católica ou todas as religiões são fusões de várias crenças. Não existe uma religião mais sincrética do que a Igreja Católica. A procissão que a gente encontra pelas ruas é a procissão que os gregos faziam para os seus deuses.

R.: Após a abolição, como ficou situada a Irmandade da Boa Morte?
C.N.: Elas passaram a cultuar, mas elas perderam seu sentido político, seu sentido de resistência política e passaram a ter uma função essencialmente religiosa.

R.: Qual a importância da mão de obra negra e feminina na cultura do fumo no Recôncavo?
C.N.: A cultura do fumo, diferente da cultura do açúcar, não exigia muita mão de obra. Então você vê uma rarefação escrava nesta zona de tensão ecológica, entre o agreste e o recôncavo, que é Feira de Santana, São Gonçalo dos Campos, Conceição da Feira, Muritiba. Você vê uma população escrava africana rara, e uma população crioula muito grande. O fumo era uma cultura quase que doméstica, agora, com a industrialização do fumo, o que vai acontecer é o contrário. Geralmente, uma fábrica de grande porte tinha mil funcionários. A mão de obra era essencialmente feminina, e também empregava crianças. Tem um trabalho de Luiz Costa Pinto, é um sociólogo dos anos 50, baiano, ele fala desta vida do recôncavo baiano em torno da figura do fumo. As mulheres estavam nas unidades fabris trabalhando e os homens, vagabundos, maridos delas, uns gigolôs. Ficavam nas esquinas, ou então nos botecos, tomando cachaça esperando que a mulher saísse do trabalho para que ele pudesse acompanhar. Além dessa mão de obra direta que era regimentada pela indústria, tinha aquela que prestava o serviço, ou seja, era um meio de sobrevivência aqui no Recôncavo Baiano. Meu pai também viveu dessa coisa até pouco tempo. As pessoas iam para as fábricas e pegavam trouxas de fumo e levavam para casa. Era um trabalho doméstico, que envolvia aqueles que pudessem trabalhar para tirar o pecíolo da folha. E, no final de semana, você devolvia a trouxa e recebia um dinheiro, isso era um meio de sobrevivência. Atraía uma mão de obra negra muito grande, mas uma mão de obra liberta.

R.: A Festa da Boa Morte consegue transmitir o significado da Irmandade para o público interno e externo?
C.N.: Não. A Irmandade hoje é completamente diferente do que se conhecia. Ela começou a ser o que é a partir de 1970. Eram raríssimas as pessoas que as acompanhavam, era o povo de santo mesmo. O percurso dela era completamente diferente. As pessoas não percebem que são três ritos: um dia antes, no dia 12, é a missa pelas irmãs que não tiveram uma boa morte, aquelas que morreram na escravidão. Boa morte, para elas, seria morrer livre, morrer com dignidade, não morrer escrava. Depois, tem a missa pelas irmãs falecidas que tiveram uma boa morte. É um momento em que elas vestem branco e aquilo significa que é um rito feito para os Eguns, feito para os ancestrais. No dia seguinte, é a procissão do enterro, que é Nossa Senhora morta. No dia seguinte, é a festa de nossa Senhora da Glória, ela cheia de jóias, de cabelo liso. Elas percorrem as ruas principais da cidade. Então, por que no dia anterior, da missa, elas dobram na rua do fórum? É porque, se elas forem pra lá, elas vão passar pelo caminho do cemitério e não pode, senão uma pode morrer. Elas têm um tabu de que há um perigo, a cidade está carregada de axé. Elas não podem sair, bater papo, tomar sol, tomar sereno. Elas fazem isso porque não sabem que podem, e Deus é pelos inocentes. Mas elas não podem fazer isso, não é pra sair atrás de turista para pedir dinheiro, é pra ficar ali escondida, como ocorre dentro de um terreiro de Candomblé quando uma pessoa está de obrigação. Não podem sair, não pode beber, assediar turistas. Elas assediam e são assediadas ao mesmo tempo.

R.: O significado (da festa Boa Morte) tem se perdido dentro da própria Irmandade?
C.N.: Perdeu. Quando chegou o momento em que essas mulheres morreram, iria acabar a Irmandade. Eram seis mulheres, morreram duas e ficaram quatro quando a Bahiatursa se interessou em “turistizar” a Irmandade da Boa Morte. Em 75-76, a Bahiatursa começou a repor membros a partir de parentes de antigas irmãs. Essas mulheres que estão aí são netas, filhas, sobrinhas das antigas irmãs. E algumas delas não eram pessoas de Candomblé e, então, o que é que se faz? Já que não são de Candomblé, e tem que ser, fizeram um ritual que se chama sacrifício à cabeça. Outro critério é de que essas mulheres têm que ser necessariamente pessoas do Candomblé, ligadas a algum orixá relacionado com o nascimento e a morte. Uma pessoa de Xangô, por exemplo, não pode ser irmã da Boa Morte.

R.: Foi muito difícil lidar com a Irmandade pra colher informações sobre seu estudo?
C.N.: Eu tive sorte. Uma vez a Irmandade da Boa Morte me processou porque, quando teve uma briga entre a Igreja e a Irmandade, eu, “Bojão” e Antônio Moraes Ribeiro fomos as primeiras pessoas a denunciar num jornal o que a Igreja estava fazendo com a Irmandade. Obtiveram as jóias e as imagens da Irmandade e prenderam lá na Igreja e não entregavam porque a Bahiatursa estava “turistizando”. O Padre Hélio veio com uma ordem do bispo Dom Lucas Moreira Neves para acabar com todas as irmandades negras de Cachoeira. Então, acabou a Irmandade dos Martírios e eles queriam acabar também com a Irmandade da Boa Morte. Mas nós dissemos: “aqui não”. Foi aí que eles foram descobrir que a Irmandade da Boa Morte é uma Irmandade dentro, mas fora da Igreja. Ela não é uma Irmandade da Igreja.


R.: Isso era um segredo da Irmandade?
C.N.: Isso era um dos segredos. E a Igreja nunca se deu conta disso, que ela (a Irmandade) tinha outras coisas. E houve uma disputa entre o Estado e a Igreja, entre a Bahiatursa e a Igreja, e quem ficou no centro foi a Irmandade sofrendo todas as conseqüências, todas as humilhações do padre.

R.: E esse sumiço das jóias, muitas jóias sumiram?
C.N.: Essas jóias estão aqui na Igreja Matriz e a Igreja reivindica a propriedade como reivindica da Irmandade dos Nagôs, na Igreja dos Nagôs. Os bens estão todos na Igreja, fazem parte de um museu de alfaias que foi fechado porque, diz o padre, roubaram as peças. Isso não é verdade. Quem roubou foi ele, todo mundo sabe disso. Conheço uma menina que foi empregada doméstica dele, que fala: “já vi, e esta lá a peça na casa dele”. (Procurado pela reportagem do Reverso, Padre Hélio César Leal Villas Boas disse que não comentaria as declarações de Cacau Nascimento)

R.: Cachoeira é uma cidade de religiões de matriz africana conhecidas no mundo. Existe ainda a questão da intolerância religiosa em Cachoeira?
C.N.: A questão da intolerância é muito sutil, porque quem não tolera o Candomblé, em Cachoeira, não são as igrejas neopentencostais, quem não tolera é a comunidade mesmo, aquele que não é de Candomblé. E acontece o seguinte, é um paradoxo, porque, ao mesmo tempo em que você vê as pessoas expressando o preconceito com os terreiros de Candomblé, eles estão praticando. O catolicismo doméstico, em Cachoeira, é muito intenso, as festas de São Cosme, São Damião, Santa Bárbara acontecem nas grandes famílias de Cachoeira, nas famílias mais abastadas. O irmão do prefeito mesmo tem um Caboclo, que ele cultua. A casa dele é um terreiro de Candomblé.

R.: Você pretende continuar os estudos da Irmandade ou você têm em vista outros estudos?
C.N.: Eu tenho um trabalho escrito sobre a comunidade da Boa Morte, que eu não sei porque eu não publico. Eu tenho muito medo de Nanã (referindo-se a orixá) porque toda vez que eu vou fazer alguma coisa para a Irmandade da Boa Morte acontece alguma coisa comigo.

R.: Quando você estava falando sobre a intolerância religiosa, você acredita que essa intolerância é a causa de a Irmandade da Boa Morte ser mais reconhecida pelos turistas estrangeiros do que pelos baianos?
C.N.: É, sem dúvidas. Eu posso apresentar fotos antigas e vocês vão ver que elas andavam em uma fila e não duas filas. Elas vinham e ninguém acompanhava, ninguém. Apenas alguns homens, que elas chamavam para segurar a imagem. A imagem de Nossa Senhora falecida não pode ser segurada por ninguém, só pode ser elas. Mas hoje todo mundo pega, turista pega, o ministro pega, a senadora pega.

R.: Você acredita que a festa hoje tenha um caráter mais comercial?
C.N.: É. Uma vez a Globo fez uma parafernália, colocou aquelas gruas e mandou tirar a imagem e arrastou todo mundo pra ficar somente elas. Foi assim um horror, então, virou isso.

R.: Você acha que intervenção mercadológica, midiática prejudica a cultura, prejudica a Irmandade?
C.N.: Do ponto de vista econômico, a festa atrai muita gente e lota os hotéis, os restaurantes. Eu dou muita entrevista, o pessoal me paga uma grana. Eu considero, por ser uma pessoa religiosa e uma pessoa de dentro do Candomblé, que nesse período a cidade de Cachoeira ela esta energizada de axé. Eu acho que os ancestrais retornam pra comemorarem junto com elas. Eu sempre falo, elas (as irmãs da Irmandade) precisam falecer para que estejam no mesmo plano destas mulheres falecidas. Vocês estão ritualmente mortas, e isso é um dado antropológico, uma percepção antropológica, não é de minha fé religiosa. Para que o rito tenha eficácia, é preciso que elas morram.

R.: As irmãs da Boa Morte são muito exploradas, passam muitas dificuldades, e tudo isso não traz nada em benefício para elas?
C.N.: Não traz. É um compromisso que elas têm, pelo contrário, elas têm que dar. A lógica, o dogma, é o doar-se, não é o receber. É como no Candomblé, você se doa, você não ganha. O que ocorre na Irmandade da Boa Morte é que não há mais essa sacralização, não há um respeito da comunidade. O que elas faziam um dia antes da festa (de sair em procissão), com farofa de azeite, farofa de mel, farofa de água, água e cachaça aspergindo os lugares por onde a procissão iria passar, hoje, elas não têm mais condição de fazer. Não podem mais fazer isso porque as pessoas ficam olhando, está lá um sambão na porta, um arrocha, um pagode no bar, estão os turistas.


R.: Cachoeira é uma cidade histórica e a gente vê a cidade um tanto quanto abandonada. Como você percebe isso?
C.N.: Cachoeira centralizava o comércio. Para você ter uma idéia, todo o ouro produzido no Brasil passou obrigatoriamente pelo rio Paraguassu (em Cachoeira), porque não havia outro caminho. A metrópole mais importante do novo mundo era Salvador, o mais importante porto da América era o porto baiano. E o porto de Cachoeira era o segundo porto mais importante da Bahia, então, Cachoeira era o segundo maior porto do mundo. E não estou aqui exagerando, eu estou falando coisas concretas, isso é um dado histórico e está publicado. Então, chega um momento, no século XIX, que Cachoeira torna-se riquíssima. Ferrovia ligando Cachoeira até Montes Claros, em Minas Gerais, o segundo porto mais importante, o açúcar, o tabaco. Em 67, Cachoeira perde a ferrovia, o trânsito fluvo-marítimo também é desativado com a inauguração da BR 324, e começam a aparecer os veículos. Então, Cachoeira entra numa decadência a partir de 1950 e, quando chega no início de 70, Cachoeira estava acabada. Descobrem petróleo em Candeias, surge a refinaria Landulfo Alves. Essa parte do recôncavo, que faz parte hoje da região metropolitana de Salvador, começa a crescer de uma forma vertiginosa e Cachoeira, São Félix, Muritiba ficam fora deste processo de expansão, de enriquecimento petrolífero. Em 60, surge o centro Industrial de Aratu, em 70 o Pólo Petroquímico de Camaçari. E Cachoeira entra num processo de falência absoluta. São Francisco do Conde cresce, Santo Amaro cresce, Candeias cresce e Cachoeira fica numa situação ruim. Então, quando você encontra esses prédios antigos, alguns ainda preservados, não é porque o cachoeirano tem o espírito de conservação, de preservação dos seus bens culturais, é porque a cidade ficou pobre e ninguém teve condição de derrubar e fazer um palacetezinho igual aos de Santo Amaro. Chegou 70, e tombaram a cidade de Cachoeira e aí que não pode mais. Se não tivesse tombado, estaria igual a São Félix, Santo Amaro.

R.: O que você acha de Cachoeira como Patrimônio da Humanidade?
C.N.: Cachoeira é uma cidade que já foi muito mexida. Não vejo mais, porque não existe um espírito preservacionista aqui. Cachoeira, hoje, passa por processo de favelização muito grande. Eu não acho legal a administração de prefeito atual Tato. Ele faz uma péssima administração, porque ele faz uma administração toda ela populista. Ele fura muito a cidade, ele quebra muito, pinta de azul e amarelo. A coisa mais ridícula é pintar uma cidade de azul e amarelo, eu nunca ouvir dizer que ninguém pinte a cidade de duas cores só. É uma agressão para qualquer arquiteto, talvez para ele não. Mas ele gosta muito de arrocha, ele gosta muito de pagode. Agora, para um arquiteto que estudou, ele vai dizer: quem foi o maluco que pintou isso? O que acontece, em Cachoeira, é que o prefeito pensa que está fazendo uma grande administração, porque esta fazendo Portal da cidade, postos de saúde. Quer dizer, existem um “bocado” de prédios de saúde, mas o posto de saúde não tem um aparelhinho para medir a temperatura, como aconteceu com a minha filha, que estava com febre e a médica pediu à enfermeira um termômetro e ela disse: “não tem termômetro”.

R.:Você publicou recentemente uma nota, e no final você faz uma crítica aos vereadores, por quê?
C.N.: Porque eles não pensam. Na verdade, essas pessoas não estão preocupadas com a administração da cidade. Primeiro que eu acho que uma Câmara de Vereadores deve ter uma independência, você não tem que aplaudir tudo que o prefeito fala. Eu acho que deve ter um pouco de independência, e você não pode ser leviano.

R.: As pessoas vêem a UFRB como uma esperança. Em Cachoeira, como o senhor vê esta esperança?
C.N.: Esta universidade é uma reivindicação antiga do povo de Cachoeira. A gente queria uma FTC, não espera uma coisa tão grande. Eu acho que vocês estão trazendo para Cachoeira uma nova mentalidade.

domingo, 17 de agosto de 2008

Sobre 1ª Conferência de Comunicação Social


Aconteceu nos dias 14,15 e 16 de agosto a 1ª Conferencia de Comunicação Social da Bahia,que contou com a participação dos delegados eleitos em plenarias ocorridas no interior do estado e em Salvador.Foram discutidos e votadas propostas que visam promover,de forma democrática,o acesso à comunicação,que contempla a melhoria das políticas publicas no setor,alem lutar por um desenvolvimento regional mais justo,adequando o acesso de novas tecnologias à realidade das comunidades assistidas,assuntos esses que nortearam dinâmica do evento.A UFRB marcou presença através dos alunos Gustavo Medeiros(4º Semestre) e Julio Cesar(2º Semestre),que contribuiram para a formação da Carta da Bahia,que foi votada na fase final do evento.Eles representaram tambem o Territorio do Recôncavo,que contou com a presença de 4 delegados entre os 247 presentes no hotel Sol Bahia em Salvador.O texto completo esta no site http://conferencia.comunicacao.ba.gov.br/ ou http://www.comunicacao.ba.gov.br/noticias/2008/08/16/carta-da-bahia-e-aprovada-no-ultimo-dia-da-conferencia

terça-feira, 1 de julho de 2008

Cultura

Guerra de espadas: diversão perigosa

Queima de fogos atrai milhares de turistas a Cruz das Almas nas festas juninas

Daniela Silva, Meire Fiúza e Patrícia Neves

O São João de Cruz das Almas atrai cerca de 100 mil visitantes todos os anos, que dançam e se divertem ao som das bandas de forró, do tradicional pé-de-serra ao novo forró elétrico. Além do arraiá, outra atração que encanta moradores e turistas no São João da cidade é a tradicional guerra de espadas. Os fogos são queimados na maioria dos bairros. Os fogos são fabricados pelos próprios moradores, no quintal de suas casas. O material para confecção do produto.é providenciado desde o final de junho, quando terminam as festas.
Roberto Santos, 45 anos, diz que já faz espadas há 27 anos e explica passo a passo como fabrica o artifício, desde de a retirada do bambu, principal material para a fabricação, até a fase da queima. Os outros materiais, como pólvora, barro, limalha de ferro, salitro e cordão de sisal encerado fazem parte do conjunto que tem como arte final um show de beleza e perigo.
“Deve-se enrolar o cordão de sisal encerado em volta do bambu bem apertado para que ela não exploda”, afirma. A fabricação é muito detalhada e qualquer erro pode comprometer o uso da espada. Neste ano, a dúzia das espadas custava de R$ 70 a 100. Quando questionado sobre o perigo, Roberto diz que cada pessoa tem que ter cuidado com a fabricação, não colocar fogo e nem beber perto do material. Ele diz ainda que nunca sofreu nenhum acidente.
Apesar do custo alto e de muito trabalho, os espadeiros não deixam que a tradição das espadas acabe. Eles contam os meses para que possam participar desta manifestação que envolve diversão e perigo para quem toca (queima) e para quem se arrisca a assistir.
A maioria dos espadeiros acredita que a guerra atrai os turistas para a cidade, e a festa em si fica em segundo plano. “Bandas de forró têm em todos os lugares, até melhores das que tocam aqui, mas o povo vem mesmo é pra ver a batalha que é um espetáculo bonito e só tem aqui”, diz Sérgio Lopez, 48 anos, espadeiro desde os 12 anos. Lopez organiza, há 30 anos, o casamento (uma batalha de espadas que começa com um casamento da roça e termina com a queima dos fogos) do CEAT (Colégio Estadual Alberto Torres). Ele conta que tudo iniciou com um trabalho pedagógico realizado com o irmão, quando eles ainda eram estudantes do segundo grau. A brincadeira virou uma tradição que movimenta a cidade até hoje.
A cidade toda se envolve com a guerra. As fachadas das casas residenciais e comerciais são cobertas com papelões. Bares e quiosques cercam as suas áreas com tela e maderite para formar os camarotes e cobrar pela entrada no estabelecimento. Os comerciantes afirmam que o local é seguro e dá para ver a guerra à vontade.
O aposentado Eliel Santana diz que antigamente gostava que seus parentes viessem à sua casa para ver a guerra de espadas, mas, infelizmente, agora não se sente mais seguro em fazer isso. Há muita polêmica em torno desse assunto. Muitos moradores são contra a queima de espadas, pois ela suja as fachadas das casas, além de quebrar telhas e ferir muitas pessoas que não estão participando da festa. No último São João, Edson Teixeira, de seis anos, que residia na zona rural da cidade, morreu com queimaduras de terceiro grau na cabeça e no tórax porque estava em local com grande concentração de pólvora. Outro incidente também aconteceu quando uma espada entrou na sala de parto do hospital Santa Casa de Misericórdia, quebrou vidraças, aparelhos e espalhou pólvora e barro por todo local. Por sorte, o recém nascido já havia sido retirado do local, mas duas enfermeiras ficaram queimadas.
Além dos espadeiros, há os que defendem a tradição na cidade. Inclusive, moradores dos bairros com grande concentração de queima de espadas se divertem com o espetáculo. Nos dias em que acontecem as guerras, as pessoas saem mais cedo do trabalho por causa do perigo que o artifício proporciona.
A batalha principal acontece no dia 24 de junho na praça Senador Temístocles. Porém, outras acontecem nos bairros, organizadas pelos moradores. Em alguns locais é proibido queimar espadas, mas poucos espadeiros respeitam o decreto. Uma campanha, feita pela prefeitura, com nome “Espadeiro Consciente”, tenta controlar os fogueteiros para que eles não provoquem tantos acidentes. Neste ano, mais de 200 pessoas ficaram queimadas na guerra de espadas. Três ficaram em estado grave e foram encaminhadas para o Hospital Geral do Estado. Segundo os médicos da Santa Casa de Misericórdia, a maioria dos queimados ingere bebidas alcoólicas, o que provoca grande parte dos acidentes.

Patrimônio

Desafios da conservação

Manutenção dos prédios restaurados pelo Monumenta gera preocupação

Kelma Costa e Palloma Braga

Muitas propriedades, públicas ou privadas, que fazem parte da rica e colonial estrutura arquitetônica da cidade de Cachoeira se encontram em precárias condições de conservação. Isso não passa despercebido aos olhares de nativos e visitantes. Alguns imóveis, que antes apresentavam características de abandono e deteriorização, já foram contemplados pelo Monumenta. Entretanto, alguns prédios restaurados já apresentam sinais de desgastes. Logo, é pertinente a criação de mecanismos que possibilitem a conservação dessas estruturas.
Inicialmente, o Monumenta, programa do Ministério da Cultura com financiamento do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e apoio da Unesco, tinha como prioridade a realização de reformas em estruturas arquitetônicas públicas que fazem parte do acervo histórico da cidade. Posteriormente, os benefícios estenderam-se às propriedades privadas. A primeira ação efetuada pelo Monumenta foi a restauração da Capela Nossa Senhora D’Ajuda, construída entre os séculos XVI e XVII. A capela já apresenta indícios de degradação por conta da falta de conservação da sua estrutura. Em seguida, foram restaurados outros monumentos, como o Conjunto do Carmo e a Igreja Matriz de Nossa Senhora do Rosário.
PRESERVAÇÃO - Luydy Fernandes, professor do curso de Museologia da UFRB (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia), assinala a importância da conservação preventiva. Segundo ele, a conservação corretiva é muito mais cara, drástica e morosa, enquanto a intervenção preventiva é mais fácil e pode ser feita no dia-a-dia. Sanar uma infiltração, um problema no telhado e conservar a pintura são medidas de conservação preventiva. Para Luydy, a integridade do imóvel deve ser garantida pelo ocupante, sendo que as áreas tombadas da cidade estão sujeitas à intervenção do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
Lidiane Alves, administradora do Monumenta, salienta que os imóveis restaurados pelo programa do Ministério da Cultura têm a garantia de acompanhamento e novos reparos no prazo de cinco anos. Entretanto, ela afirma que a manutenção interior do imóvel deve ser mantida por quem o utiliza.
Geralmente, as grandes restaurações não são mantidas. Num curto espaço de tempo, a estrutura mostra-se novamente degradada, sendo necessário uma nova intervenção que exige maiores recursos financeiros. Exemplo disso foi a restauração do prédio que abrigava o Arquivo Público. Este, por encontrar-se em desuso, já que as autoridades ainda não decidiram qual será a sua finalidade, apresenta sinais de descaso, como lixo e vegetação na sua estrutura.
DIFICULDADES – De acordo com Jomar Lima, coordenador do Museu das Artes Sacras de Cachoeira, a maior dificuldade que a Igreja enfrenta para preservar o patrimônio é a carência de recursos para a sua manutenção. A Igreja Católica, que já vivenciou períodos de opulência, passou a sofrer, nos últimos tempos, dificuldades financeiras que também resultam na perda do prestígio de outrora. “No passado tinham pessoas abastadas. Se a igreja precisava mudar o telhado, essas pessoas vinham e bancavam. Esta realidade acabou. É muito raro ver hoje pessoas abnegadas que tiram do próprio bolso recursos para manter isso”, diz Jomar.
Uma saída para esse tipo de problema tem sido o empréstimo de alguns espaços da igreja no esforço de obter recursos financeiros. Essa experiência ocorre com a Pousada do Convento. Fundado pela Ordem dos Carmelitas, o antigo convento passava por sérios problemas de auto-sustentação. Por conta disso, o seu espaço foi cedido a terceiros que, além de zelar pela sua conservação, ainda pagam à ordem Carmelitana, que tem sede em Salvador e São Paulo.
Segundo a administradora do programa Monumenta, em Cachoeira, 141 imóveis privados foram beneficiados e esperam repasse do recurso emitido pela Caixa Econômica Federal. De acordo com a renda do proponente, o empréstimo pode ser pago em até 20 anos. Para obter recursos do Monumenta, o imóvel privado tem que estar dentro da área tombada ou próxima aos prédios públicos.
Zélia Dias do Nascimento teve o seu prédio reformado com recursos cedidos pelo Programa. Ela destaca a importância de estar com a documentação do imóvel em dias para a concessão do empréstimo. Reformada, a propriedade só pode ser vendida após toda a dívida com o projeto ser quitada.

Cultura

Produção cultural emperrada

Artistas e órgãos relacionados ao setor cultural de Cachoeira não dialogam

Astrude Modesto, Caio Barbosa, Queila Oliveira e Talita Costa

Cachoeira é apresentada para turistas de todas as partes como a cidade da riqueza histórico-cultural. Esse rótulo constrói a idéia de que o campo cultural da cidade está inserido num sistema extremamente organizado e que responde aos mais variados requisitos do mercado artístico contemporâneo. Não é esse o cenário para quem vive a cultura local mais de perto.
Os pintores irmãos Carlos e Juvenal Martfeld acreditam que viver de arte em Cachoeira é uma vergonha. “As pessoas não têm dinheiro nem cultura. Preferem dar vinte mil reais em carros, mas não dão nada para um quadro”, comentou Carlos. Ele está temporariamente em Cachoeira e já chegou a vender quadros nos Estados Unidos. Hoje, expõe seu trabalho no atelier do irmão Juvenal, localizado na Rua Ruy Barbosa.
Juvenal Martfeld diz morar em Cachoeira há muito tempo e que pinta quadros por gosto pessoal. Ele se queixa da desunião em que vivem os artistas cachoeiranos. “Existe até uma associação, mas ela não funciona de fato”, afirmou.
Outro problema levantado pelos irmãos Martfeld é quanto à questão dos direitos autorais das obras. Carlos afirma que só turistas entram no atelier. Muitos deles para fotografar. Os irmãos não se sentem à vontade com a idéia de terem suas pinturas fotografadas. “Os gringos tiram fotos e ampliam para vender fora do país”, comentam. Carlos afirma que um amigo já viu um de seus quadros, que nunca foi vendido por ele, exposto numa vitrine italiana.
O Secretário Municipal de Cultura, João de Moraes, se incomoda com a espetacularização da cultura cachoeirana, ao mesmo tempo em que acredita que os artistas da cidade precisam ter uma visão mais ampla do sistema mercadológico em que estão inseridos. De acordo com ele, os bens culturais não devem ser pensados apenas enquanto tradição nem tampouco exclusivamente como mercadoria.
Através do Seminário de Cultura e Turismo de Cachoeira, realizado em julho de 2008, a secretaria pretendia inserir na comunidade artística justamente a idéia de que a cultura tem acepções mais amplas que não somente as que tocam a idéia da arte enquanto produtor e produto.
Outro projeto é o de separação das secretarias municipais de cultura e turismo, uma vez que essas duas possuem metas distintas. Pretende-se criar o Conselho Municipal de Cultura de Cachoeira, que estará mantendo relações mais estreitas com o governo do Estado, em ações afirmativas para o setor cultural da cidade.
Moraes critica a conduta de alguns artistas cachoeiranos que desejam que algum órgão os adote e lhes conduza ao desenvolvimento. Muitas pessoas, por exemplo, consideram que o Centro Cultural Dannemann, localizado em São Félix, serve de palco apenas para artistas plásticos de outras localidades e que este fato evidencia um descaso para com a produção cultural local. Segundo Moraes, os próprios artistas não estão atentos aos requisitos necessários para a exposição de trabalhos nos eventos produzidos pelo Dannemann.
AUSÊNCIA DE DIÁLOGO - João de Moraes, que também é sócio da Associação dos Artistas, comentou que não existe um diálogo efetivo entre a organização e a Secretaria de Cultura. Cogitou-se, por exemplo, a idéia de execução de uma feira de artesanato durante o São João de 2008. A feira seria realizada na Praça 25 de Junho, um dos circuitos mais movimentados da festa de Cachoeira. Segundo Moraes, a Petrobras estaria patrocinando um evento diferenciado para aquele local. Só tocaria forró pé-de-serra, o que selecionaria um público mais alternativo e de poder aquisitivo maior, que provavelmente estaria comprando os produtos expostos pelos artesãos.
A idéia da feira não se concretizou. Segundo o secretário de Cultura, uma semana antes dos festejos juninos, a Associação dos Artistas alegou que os artesãos não tinham condições para expor os seus trabalhos. Eles precisavam de bancas para colocar as peças. A secretaria de Cultura, segundo Moraes, se ofereceu para conseguir algumas dessas bancas, mas a Associação dos Artistas não aceitou que o projeto fosse realizado daquela maneira.
Moraes via na realização da feira a possibilidade de dar uma visibilidade maior aos artistas cachoeiranos e, dessa forma, reunir fundos para a realização de uma feira mais estruturada em agosto, na festa da Boa Morte.
Outro indicativo da falta de articulação da área artística pôde ser verificado no dia 26 de junho, quando foi realizado, em Cachoeira, o Encontro Setorial da Funceb (Fundação Cultural do Estado da Bahia). O evento contou com a presença do secretário de Cultura do Estado da Bahia, Márcio Meirelles, e da diretora da Funceb, Gisele Nussbaumer. Na oportunidade, os artistas cachoeiranos deveriam estar presentes, já que no evento foram apresentados os editais de projetos para o desenvolvimento artístico-cultural da região. No entanto, estiveram no local apenas o representante da secretaria de Cultura do município e quatro artistas locais, entre eles Nei Pontão, idealizador dos projetos Giga Mundo e Muleki é Tu.
A Associação dos Artistas e Animadores Culturais da Cachoeira funciona na parte superior do prédio da Secretaria de Cultura e Turismo. O diretor, Fábio Pereira, foi procurado pela reportagem, mas não foi encontrado.

CULTURA

Os trilhos da poesia

Da crítica social ao saudosismo, a poesia percorre todos os cantos de Cachoeira

Hamurabi Dias, Rosivaldo Mercês e Deyvson Oliveira

Cachoeira é uma cidade cheia encantos e contrastes, um lugar onde a cultura popular é pulsante. O que muitos cachoeiranos não sabem é que a Cidade Heróica é também rica em poetas. Uma herança que vem do seu representante mais ilustre, Castro Alves, que nasceu em Cabaceiras do Paraguaçu, mas estudou em Cachoeira. A falta de conhecimento da população sobre essa riqueza literária decorre da ausência de veículos que publiquem os versos. Segundo o poeta Francisco Mello, de 91 anos, a cidade já possuiu cerca de 60 jornais literários. Hoje, não existe nenhum.
É difícil enumerar a quantidade de poetas em Cachoeira. Dos nossos entrevistados, ninguém vive exclusivamente da poesia. São aposentados, artistas plásticos e escultores, que passam o tempo a escrever sobre as belezas da sua terra. Ronivaldo Jesus de Souza, mais conhecido como “Rony Bom”, de 37 anos, começou a escrever no final dos anos 80. Ele não é do tipo saudosista, prefere versar sobre problemas sociais. Também é artista plástico. Rony publicou uma antologia poética com seus escritos e de mais dois co-autores. Todas as suas poesias estão guardadas. Algumas, ainda escritas a próprio punho, outras já digitadas, mas todas reveladoras de uma veia crítica.
RECONHECIMENTO - Roque Sacramento Sena, de 62 anos, professor aposentado do Estado, cursou faculdade de Estudos Sociais e possui pós-graduação em Administração Pública. A arte sempre foi presença forte em sua família. Passou 51 anos da sua vida em Feira de Santana, onde estudou em um convento e, aos 11 anos, escreveu os seus primeiros versos. Nunca escondeu sua paixão pela Cidade Heróica e, mesmo passando tantos anos fora, ela sempre foi a sua principal fonte de criação. “As inspirações para fazer as minhas poesias vêm do cotidiano, da mulher, da paisagem, do Rio Paraguaçu da minha Cachoeira”, afirma Roque.
Sobre o reconhecimento do seu trabalho pela população, Roque Sena é categórico ao dizer: “Santo de casa não faz milagre.” Para ele, os poetas de fora são mais valorizados que os da cidade. Ele diz ter enviou um projeto à Secretaria Municipal de Cultura, para a publicação de suas poesias mas, por questões burocráticas, não obteve aprovação. Ele ainda espera imprimir 50 exemplares de um livro para distribuir entre familiares, amigos e em bibliotecas da cidade. Roque não tem nenhum trabalho editado em livro, mas tem os originais de Cachoeira meu amor, livro com poesias que tratam somente sobre a cidade. Entre os autores de sua preferência estão Carlos Drummond de Andrade, Augusto do Anjos e Fernando Pessoa. Conterrâneos ele também cita, como Olga Pereira, Heraldo Cachoeira, Nelson Aragão e Sabino de Campos.
VERSOS RIMADOS - Francisco José de Mello impressiona pelo seu vigor literário. “Sou um devorador de livros”, assume. Ao nos receber em sua casa, estava lendo A menina que roubava livros, de Markus Zusak. Curiosamente, apesar de cachoeirano, sua inspiração para começar a escrever poesias, aos 37 anos, foi o belo pôr-do-sol da cidade de Madre de Deus, onde trabalhava no almoxarifado da Petrobras, em 1957. Atualmente, não escreve mais poesias. Porém, as escritas retratam de forma apaixonada a sua terra natal, suas ruas, seu povo, suas festas e seu tempo de menino, todas com um toque especial: ele é amante das rimas.
Hoje, concentra seus esforços escrevendo crônicas e ensaios. Já escreveu para o jornal A Ordem e também O Guarani. Seu motivo para migrar da poesia para a crônica (ele é autor de 50) é que, segundo Mello, a segunda opção é mais aceita pelo público. Ele tem duas obras publicadas: A História da Cachoeira e Coquetel Literário. O último reúne seus ensaios, crônicas e poesias. Ele diz que, além da publicação de um livro ser cara, a vendagem é pouca. Reclama também da insuficiência do acervo público. Em sua opinião, isso impede que os jovens se interessem pela leitura.
Francisco é admirador de Drummond, Castro Alves, Casemiro de Abreu, Gonçalves Dias e mais outras levas de poetas. Morou por 10 anos em São Paulo, mas confessa que seu lugar sempre foi a cidade de Cachoeira. “Meus dois grandes amores foram minha esposa, com quem tive um casamento de 54 anos, e Cachoeira”, completa. Ele revela que tem um romance escrito, que decidiu não publicar, chamado Uma guinada de noventa graus, onde mostra sua crítica social. O motivo pela não publicação é que a história se passa na cidade do Rio de Janeiro.
Todos os seus textos estão datilografados e guardados. Em sua velha Olivetti, ele ainda escreve sobre personagens da cidade e de tempos remotos, mas seu brilhantismo na poesia o destaca no cenário poético de Cachoeira. “Eu agradeço a Deus todos os dias por ter conservado meus neorônios ativos”, fala Francisco, que deixa um conselho para os mais jovens: “Leiam, procurem ler bastante. É lendo que se faz cultura.”


H Menor

O problema
da minha magreza
não é produto
da inanição.
É que existem
coisas, de fato,
que não dá
para engolir.

Rony Bom


“Uma morena no alto do morro, Socorro
Cabrocha morena corpo de violão
Cabelos bem compridos era mesmo um morenão”

Entrevista

Entre acordos, expectativas e defesas

Professor Borges diz porque abdicou de sua candidatura e defende Tato

Avana Cavalcante, Mariana Cardoso, Sayonara Moreno e Vivian Aguiar

O professor Pedro Borges dos Anjos, nesta entrevista, fala sobre a sua decisão de abrir mão da candidatura a prefeito de Cachoeira e sobre a atual polêmica envolvendo o prefeito da cidade, Fernando Antônio da Silva Pereira, o Tato. Borges tem 64 anos, é formado em Língua Inglesa pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Fez mestrado na School for International Training, nos EUA. Além disso, é bacharel em Teologia pela Faculdade Filadélfia Internacional e doutor em divindade pela mesma instituição.
REVERSO: Como é a sua relação com o prefeito Tato?
PEDRO BORGES: Já há algum tempo, o prefeito Tato tem uma boa relação comigo. Ele diz que tem respeito pela minha candidatura, mas gostaria que eu ficasse com ele por querer que eu participe do seu futuro governo. Tato vinha sempre me fazendo essa proposta e, realmente, ele está estourando nas pesquisas, com 78,3%, seguido por Raimundo Leite, com 8,3%, e eu mais abaixo ainda. Pensando nisso, vi que não ficaria bem sustentar uma candidatura minha sem expressão de competitividade. Ele mandou o Secretário de Educação vir aqui e eu fui até lá ao gabinete dele conversar, já que nós tínhamos algumas propostas de geração e ocupação de emprego e renda e a vinda da empresa Bonatec pra cá. Se ele aceitasse incluir isso no futuro governo dele, nós fecharíamos. Tato aceitou a proposta. Temos mais umas duas idéias em nível de educação, fechamos com ele e nosso partido – o PMN (Partido da Mobilização Nacional) - passou a integrar a coligação. O prefeito inclusive pediu que eu fosse candidato a vereador por eu ter possibilidade de eleição, por achar que a Câmara precisa de mim, mas eu ainda estou considerando essa possibilidade.
R.: A Bonatec é uma empresa de que?
P.B.: É uma empresa que produz peças de veículos lá de São Paulo. E 30% da produção desta empresa é aqui na Bahia. E o diretor já estava com um protocolo para instalá-la em Camaçari. Como ele é amigo de minha família, eu pedi que fosse aqui em Cachoeira
R.: Então, o PMN ele fez uma coligação com o partido do prefeito?
P.: Exatamente. São 19 partidos que entraram em coligação com o partido dele.
R.: No dia 25 de junho, vimos uma parte da população cachoeirana pedindo a candidatura do prefeito Tato. O senhor saberia nos explicar o que está acontecendo em torno do prefeito?
P.B.: O prefeito Tato foi eleito pelo PFL e é amigo do ex-governador Paulo Souto, que o ajudou muito, desde seu tempo como vereador. Praticamente, o prefeito Tato teve uma prefeitura paralela nesse período, porque o governador atendeu tudo o que ele pediu. Mas logo que ele foi eleito, e o governador Jacques Wagner também, ele teve a proposta de passar para o PMDB do ministro Geddel Lima, com promessas de que a mudança seria melhor pra ele. Ele acatou e passou para a base aliada do governador Wagner e vinha sustentando isso. Recentemente, o prefeito pediu apoio aos Democratas (novo PFL) e Paulo Souto concordou. Eles vieram aqui e nesse encontro foi oficializado o apoio dos Democratas ao Tato. Só que, quando foi fazer seu discurso, houve um momento em que ele disse que não tinha nenhum compromisso em apoiar os candidatos do PMDB, nem a vereador nem a deputado federal, e que sua obrigação era com o partido que o elegeu. Seus adversários pegaram essa gravação e levaram ao presidente do PMDB, Lúcio Lima, irmão de Geddel Lima. Ele ordenou a presidenta do PMDB de Cachoeira, sogra de Raimundo Leite, que entregasse os dígitos do partido ao seu adversário.
R.: Mas o senhor continua apoiando o prefeito Tato?
P.: Continuo apoiando-o, e, além disso, o seguinte: ele também foi expulso do PMDB. A executiva se reuniu em seguida e o expulsou. Ele agora se encontra sem partido. Mas Tato é uma pessoa de muitos recursos: recursos de oratória, recursos financeiros, por isso contratou bons advogados que estão buscando na Justiça que a convenção seja válida e a Justiça reconheça sua candidatura. O resultado está próximo de sair e, se tudo acontecer como se espera, ele sairá como candidato. Se ele não conseguir, o prefeito Tato tem nomes dentro desta coligação para apontar, e que terá grandes chances de ser bem sucedido nas eleições. Eu espero que recaia no meu.
R.: Iríamos perguntar justamente se o seu nome seria um dos possíveis de ser apontado...
P.B: Eu estou na coligação e espero realmente que o meu nome seja apreciado, porque evidentemente todos tem méritos mas, para a disputa, tem que se procurar um candidato cuja intelectualidade e o nível cultural esteja de acordo com o desenvolvimento de Cachoeira. Eu reconheço que tenho esses méritos. Eu quis ser candidato porque eu tenho certeza que posso ajudar Cachoeira no seu desenvolvimento.
R.: O que o senhor achou da manifestação de parte da população da cidade com relação ao prefeito?
P.B.: Eu achei muito válido que a população se manifeste, tendo em vista o prefeito que ele é, podemos observar as diversas obras que ele tem realizado na cidade. E é uma pessoa de mente aberta, se você chegar com uma sugestão para fazer, com certeza ele irá considerá-la para eventualmente incluí-la no seu plano. De modo que eu achei muito positiva a manifestação da população.
R.: Em contrapartida, existem rumores e acusações envolvendo o monopólio da família Pereira nas empresas da cidade. O que o senhor pode nos dizer sobre isso?
P.B.: Ele não pode impedir que sua família cresça com seus próprios recursos aqui. É uma família de fazendeiros muito rica e nada impede que seus empreendimentos continuem prosperando em Cachoeira.
R.: A oposição denuncia que as compras municipais são feitas nos estabelecimentos da família Pereira. O senhor poderia afirmar se isso realmente acontece?
P.B: Eu não tenho muito conhecimento a respeito disso, contudo, por mais que o prefeito não queira fazer essas compras, ele vai se sentir até obrigado a fazê-las. Os Pereira são donos de casas de material de construção, de supermercados, de postos de gasolina e muitos destes estabelecimentos não têm empresas concorrentes, ou seja, não dá pra comprar em outro lugar. Mas eu não tenho maiores detalhes para dar sobre o assunto.
R.: Outra denúncia que é feita é de que existem laranjas por trás da família, recentemente isso foi dito até relacionado à loja de conveniências Vieira...
P.B.: Eu venho acompanhando isso há algum tempo, sobre a administração dessas acusações. Mas uma coisa que me chama atenção é que os vereadores que falam sobre isso têm buscado na Justiça que o prefeito realmente seja punido, mas não existem provas. Então, se a Justiça sabe de tudo isso e não dá o passo para fazer a punição, ou a Justiça é irresponsável ou os vereadores estão fazendo falsas acusações.